É conversando que a gente se entende?

sábado, 22 de dezembro de 2007

Pendências

Encontram-se na rua.

Ela: Ei!
Ele: Hein? – Volta-se na direção dela. – Ah, é você.
Ela: Sim, sou eu. Eu te liguei algumas vezes, você viu?
Ele: Âhm... Vi sim.
Ela: E não me retornou a ligação porque?
Ele: Ando ocupado.

Silêncio. Ele olha para os lados, parecendo aflito.

Ela: Pode ficar tranquilo. Ninguém vai nos ver conversando.
Ele: Eu não estou preocupado.
Ela: Se não houvessem motivos de preocupação, porque não me retornou as ligações?
Ele: Já disse, eu ando ocupado.
Ela: Sim, você já disse, mas eu não acredito. Eu acho que você não quer falar comigo.
Ele: Mas é claro que... – Coloca a mão no bolso. – Porque eu não haveria de querer falar com você?
Ela: Porque você acha que se não me vir mais, o passado vai desaparecer e você vai poder viver em paz.
Ele: Mas o passado já passou. Não existe mais nada.

Ela o fita longamente. Ajeita a bolsa nos ombros e cruza os braços.

Ela: Então você já a esqueceu?
Ele: É claro que não. Isso não é possível.
Ela: Então nada passou. Tudo continua vivo aí dentro. E aqui dentro também! Você não acha que a gente deveria resolver esta pendência, pros dois poderem seguir suas vidas em paz?

Ele parece pensar por alguns momentos. Uma senhora conduzindo um cão Labrador passa por eles, fazendo com que ele tenha que dar um passo á frente para desviar da rota do enorme cão preto. Fica a alguns passos dela, desconfortavelmente mais próximo. Quase consegue ouví-la respirar.

Ele: Você até pode estar certa.
Ela: E então...?
Ele: E então que eu acho que não vai fazer diferença. Você não vai mudar sua forma de pensar e eu não tenho mais paciência de ficar me explicando, cinquenta mil vezes.
Ela: Mas você nunca se esforçou para que eu pensasse diferente! Desde que... Desde que tudo aconteceu, você simplesmente se recolheu no seu cantinho, na sua vida aparentemente perfeita, na sua nova...
Ele: Vamos parar por aqui. Esta conversa não faz sentido.
Ela: Prá você nada faz sentido nunca. Explicar o porque de ter ido embora, por exemplo...
Ele: Mas era preciso alguma explicação? Tudo estava tão explícito!
Ela: Prá você! Não para mim, não para nós. Você simplesmente deduziu que a sua realidade fosse a única e se mandou! Não fez questão nenhuma de minimizar os traumas!
Ele: Está vendo? É por isso que não retorno suas ligações. Porque você é igualzinha a ela e, se eu gostasse disso, nunca teria ido embora.
Ela: Você não ouse...

Ele troca a pasta de mão, ajeita a gravata no pescoço e faz menção de ir embora.

Ele: Viva a sua vida da melhor forma que puder. Esqueça tudo isso, supere, se case e tenha a sua família. Meu solo é árido para a sua semente.
Ela: Mas...
Ele: Eu não a matei. Ela se entupiu de todos aqueles remédios porque quis e eu não vou carregar esta culpa!

Vira-se de costas e começa a andar.

Ela: Pai! Não vá embora, volte aqui... Pai!

sexta-feira, 21 de dezembro de 2007

Fragmentos

juju diz:
floooor
*juju diz:
vou dormir
raised in translation diz:
okei
*juju diz:
acabada
raised in translation diz:
vai nessa galllta
*juju diz:
amanha eh dia
raised in translation diz:
até amanhã
*juju diz:
uuuufa
raised in translation diz:
me liga quando souber de seu destino
raised in translation diz:
bom último dia de trampo
*juju diz:
entre choros, brilhos e paetês me despedirei do povo
raised in translation diz:
eba
*juju diz:
huhuhuhu
raised in translation diz:
despedidas tem que ser glamourosas
raised in translation diz:
leve os óculos escuros
*juju diz:
vou vestir pele amanhã
*juju diz:
hahahahaah
raised in translation diz:
arrasa
*juju diz:
pleno dezembro!!!
raised in translation diz:
vai de "o diabo veste prada"
raised in translation diz:
hahaha
*juju diz:
eu nao tenho nada prada.
raised in translation diz:
tem sim, e aquela falsa?
*juju diz:
da rua campos prada serve?
raised in translation diz:
se for glitz and glam serve
*juju diz:
ok. vou usar meu nivea glow
raised in translation diz:
ótimo
*juju diz:
nao tenho figurino amanhã....
raised in translation diz:
ahhh
raised in translation diz:
vc consegue
*juju diz:
vou de eu mesma, entao.
raised in translation diz:
sua melhor faceta
*juju diz:
versao veni, vidi, vici.
raised in translation diz:
exacto
*juju diz:
brava, tipo tuuf, mas dentro eh puuuuuro arco-iris
*juju diz:
hihih
raised in translation diz:
tipo nha benta
*juju diz:
HAHAHAHAAHAHAH
*juju diz:
duro de morder, gostoso de grudar?
raised in translation diz:
exatamente
raised in translation diz:
dura por fora, mas uma perdição por dentro
raised in translation diz:
tipo rapadura
raised in translation diz:
dura, mas doce à beça
*juju diz:
amo horrores vc
raised in translation diz:
eu mais ainda

quinta-feira, 20 de dezembro de 2007

Miscelânia

Andava pela praia, observando duas gaivotas que brigavam por um côco seco. Os bicos se batiam e elas davam gritinhos uma para a outra, na tentativa de amedrontar e encerrar a disputa.

Ela: Tempos árduos para vocês também – Disse a elas, que a ignoraram e continuaram a briga com mais bicadas e mais gritinhos.

Ele já estava sentado na pedra, a pedra que um dia havia sido de ambos e que hoje era só dele. Fazia tempo, muito tempo.

Ela: Oi.
Ele: Olá... Você demorou.

“Vinte anos”, pensou ela, mas não disse nada.

Ela: Como está?
Ele: Nada bem. Minha mãe faleceu mês passado, depois de sofrer bastante.
Ela: Ela não merecia isso.
Ele: Não.

Ela se sentou ao seu lado na pedra, fitando o mar azul turquesa. O silêncio que se formou era pesado e quase táctil, uma grossa parede de concreto entre eles. Lembranças de beijos e abraços tomaram sua mente e ela acendeu um cigarro.

Ele: Como ele está?
Ela: Bem. Viajando. Em um encontro na Dinamarca.
Ele: Sempre ocupado.
Ela: E ela?
Ele: Não sei. Não nos falamos há algumas semanas.

A frase foi como um soco na boca de seu estômago.

Ela: Vocês...
Ele: Divorciado. Eu imaginei que me sentiria mais leve.
Ela: E se sente como?
Ele: Nunca fui bom com essa coisa de palavras e sentimentos. Você sabe.
Ela: Eu sei.

Deu um longo trago no cigarro.

Ele: E você não largou essa bosta.
Ela: Eu não larguei muitas coisas.

Ele a fitou de modo estranho.

Ele: Você quer dizer que...
Ela: Não tive coragem.

Respondeu rapidamente, como que se quisesse se livrar daquele segredo. Não houvera tido coragem. A realidade era pesada demais para que pudesse suportá-la sozinha.

Ele: Mas nós...
Ela: Há vinte anos não existe um nós. Não abra a sua boca para falar essa palavra, a única que você sempre conheceu foi “eu”.

Ele permaneceu em silêncio, ela se arrependeu do tom.

Ela: Me desculpe.
Ele: Eu te entendo.
Ela: É que... Já foram tantas as vezes. Você me disse o mesmo tantas outras mesmas vezes e nós nunca...
Ele: Nós nunca tivemos uma chance.
Ela: Sim, nós tivemos.
Ele: Isso foi há vinte anos.
Ela: Não, isso foi há dez anos. E depois isso foi há cinco anos e foi isso também há dois anos. Porque agora?
Ele: Estou morrendo.

Ela segurou o cigarro firme entre os dedos.

Ele: É verdade. Os exames saíram no mês passado. Eles dizem que não há mais nada a fazer.
Ela: Quanto... Quanto...
Ele: Seis meses. Um ano, no máximo.

Deu um trago no cigarro, enquanto imagens passadas penetraram sua mente, fazendo com que se esquecesse de tudo; a praia, as gavoitas disputando o côco seco, a pedra, ele ali com ela. Tudo fazia parte de um passado distante.

Ele: Por favor, diga alguma coisa. Não é fácil dizer que se está morrendo e ficar neste silêncio. Já vou ter que aturar bastante silêncio no lugar prá onde vou daqui a algum tempo.
Ela: Estou grávida.

Silêncio da parte dele.

Ele: Isto justifica o silêncio.

Ela o fitou durante alguns momentos. Depois de dar um longo trago no cigarro, o apagou na pedra e jogou a bituca no chão.

Ele: Você não deveria estar fumando.
Ela: Nem deveria ter jogado a bituca no chão.
Ele: Nem deveria estar casada.
Ela: E você não deveria estar morrendo.

Silêncio.

Ele: Eu nunca deveria ter te abandonado.
Ela: Eu não deveria ter deixado você ir embora.
Ele: Então não vá embora. Fica comigo.
Ela: Até quando?
Ele: Até o final.

Finalmente uma das gaivotas ganhou a disputa e saiu voando, triunfante com seu côco seco.

Papo reto

# Fulana

- Alô?
- É a Fulana?
- Eu.
- Então eu aviso que quero meus DVDs de volta.
- Ahhh... Oi Fulano!
- Não muda de assunto. Quero meus DVDs.
- Ah, sai dessa, abre uma Skol!
- Vou abrir é a porta da sua casa à força prá resgatar o que me pertence.
- O que te pertencia, que fique claro.
- Pertencia? Mas nem meu eram, eram do meu irmão!
- Isso mesmo. Eram. Porque agora são meus. E por uso capião.
- Ah, que é isso hein?
- Ah, esquece.

(silêncio)

- E aí? Belesma?
- Trankilo. Como Deus manda.
- E as novidades?
- Meu emprego é um saco.
- Eu disse novidades, não velhidades. E a filhota? Bem?
- Ótima e sapeca.
- Gostoso como a vida deve ser.
- Se a vida fosse assim gostosa eu tava prá fazer a cirurgia do estômago.
- Hahaha!
- Hahaha!
- E aí? Vai na festa de bota-dentro da Sicrana?
- Opa, bota-dentro da Sicrana? Gostei disso!
- Ah, dá um tempo!
- Não to nem sabendo.
- Então liga prá Beltrana que ela te explica. Finalmente vou entrar na balsa, tenho que desligar!
- Tá bom, a gente se vê lá então.
- Um beijo!
- Dois prá você!

# Beltrana

- Alô?
- Beltrana?
- Ah, oi, Fulano!
- Que história é essa de quererm botar-dentro da Sicrana?
- Que?
- É o que fiquei sabendo!
- Hahaha! É que ela tá voltando! Vamos fazer festa!
- Ah, legal. Quando?
- Na terça, salão de festas do prédio dela. É surpresa, não vai dar fora!
- Eu? Mas eu sou super discreto!
- Ahã!
- E as novidades?

(Blablabla...)

# Fulano

-Fulana!
- Beltrana!
- Saudades nega!
- E eu então?
- Escuta, deixa eu te perguntar...
- Pergunte...
- Que história é essa do Fulano ir na sua casa buscar os DVDs dele?
- Queeee? Na minha casa?
- É, ele disse que vocês tinham combinado!
- Pirou!
- E disse que tava com medo...
- Medo?
- De você!
- De mim???
- Disse que tava com medo de encontrar com você sozinhos.
- Mas... Ele... Nega, ele não tá casado?
- Tá!
- E não sabe que tenho namorado?
- Sabe!
- E...
- E disse que a responsa de ser pai de família e marido tá pesada demais. Que não sabia ser correto.
- Nota-se.
- E me pediu segredo sobre o papo.
- Claro.
- Em boca fechada não entra mosquito.
- Falou e disse!

# Papo reto


É conversando que a gente se entende?

quarta-feira, 19 de dezembro de 2007

Up Side Down

O telefone toca, número desconhecido:

- Alô? - Fulana?
- Sim, sou eu. Quem fala?
- O Homem Da Sua Vida.
- Hein? (silêncio) - Oi, Fulana. É o Sicrano.
- Nossa, quanto tempo, tudo bem Sicrano?
- Tudo bem sim, e você?
- Tudo, graças a Deus.

(silêncio)

- E aí?
- Ahhh... Então, Fulana, você está ocupada, quer que eu te ligue depois?
- Não, imagina. Pode falar. Que surpresa, não nos falamos há mais ou menos... Ahm... Uns dois anos?
- Dois anos e cinco meses.
- Uau! (silêncio) Que exatidão.
- Então Fulana... E depois de todo este tempo, eu estou te ligando pra te perguntar uma coisa.
- Hum... Okei, pode perguntar!
- Porque é que a gente não se viu mais?

(silêncio)

- Como?
- É, num dia estávamos saindo e trocando juras, no outro nunca mais nos vimos.
- Hum, na minha visão não foi bem assim que aconteceu, mas de qualquer forma... Porque é que você quer saber disso, depois de tanto tempo?
- Porque eu estou fazendo análise sabe... Três vezes por semana, e meu analista me deu essa lição de casa, de te procurar e perguntar o porquê de nunca mais termos nos visto.
- Ah, você está fazendo terapia?
- Não é terapia. É análise.
- Ah, sim, me desculpe.

- Três vezes por semana.
- Ah, mas isso é excelente!
- O que você quer dizer com isso? Que eu sempre fui completamente fodido?

(silêncio)

- Não... É claro que não, imagine! Me desculpe, eu não quis...
- Deixa pra lá. Esquece. Eu, supostamente, não devo me importar com a opinião das pessoas a meu respeito, esta é outra lição de casa que meu analista me deu.
- Eu não sabia que analistas davam lições de casa.
- Eles dão.

(silêncio)

- Então, Fulana, a pergunta...
- Ah, sim. É claro. A pergunta. Bem...

(silêncio)

- O que quer que seja que tenha acontecido, você pode me falar. Eu agüento.
- Bem, Sicrano, eu não sei qual a melhor forma de te dizer isso, mas... - Mas...?
- É que, bem... Você nunca mais me ligou!

(silêncio)

- Como?
- Sim, é verdade. Num dia você veio aqui em casa, era véspera de feriado. Passamos a noite juntos e você disse que ia me ligar depois do feriado, que trabalharia no feriado... E não me ligou mais!

(silêncio)
(silêncio)
(silêncio)

- Sicrano?
- E você não me ligou uma única vez?
- Bem, eu...
- Você dizia que gostava tanto de mim e não me ligou uma única vez? Dizia que nunca tinha sentido por ninguém o que sentia por mim e não correu atrás do homem da sua vida?
- Bom, na verdade eu nunca disse nenhuma dessas coisas, mas bem, eu te liguei sim!
- Hein?
- Sim, eu te liguei. E você disse que estava em reunião e que me ligava depois. Como você não me ligou, eu te liguei na outra semana mas você também não atendeu ao celular.
- Como? Eu não atendi ao celular?
- Não. E depois de um tempo fiquei sabendo pelo Beltrano que você estava namorando. E bem, aí eu... Achei de bom tom não voltar a te ligar.

(silêncio)
(silêncio)
(silêncio)

- Hahahahahahahaha, quá quá quá quá, kikikikikiki, hahahahahaha!
- Sicrano?
- Me desculpe, Fulana, mas... Hahahahaha! (silêncio) - Ai, ai... E esse tempo todo eu achando que eu é que tinha sido rejeitado!
- Bem, eu...
- E na verdade eu é que não quis mais nada com você! E acho que até me lembro o porquê!
- Ham...
- Quer saber o porquê?
- Não, na realidade não me faz muita diferença, mas...
- Como assim não te faz diferença? Você não tem vontade de saber o porque de ter sido rejeitada?
- Bom, na verdade não, quer dizer, isso já faz tanto tempo que eu... Bem, eu estou namorando, então seja lá qual for o motivo, não faz mais diferença hoje em dia...
- Não?
- Não mas... Bem, se isso fizer parte da sua lição de casa na análise você pode me dizer.

(silêncio)

- Como assim? Você está sugerindo que TE dizer alguma coisa sobre MIM poss ser lição de casa da MINHA análise?
- Não, eu só quis...
- Você que vá fazer análise pra ter as suas próprias lições de casa e aí me ligue e pergunte o porque de eu não ter querido mais nada com você!
- Como?
- Passar bem!

Ligação encerrada.

Cores

juliano-me-myself says: tah dificil de te achar, e tenho procurado!
raised in translation says: também ando me procurando, quem sabe não me acho?
juliano-me-myself says: então me ajuda. onde foi que você se achou, da última vez?
raised in translation says: na classe econômica de um avião rumo a Lima. sabe aqueles microsegundos que antecedem o pouso? quando os comissários de bordo se dirigem a seus assentos e afivelam os cintos?
juliano-me-myself says: fala mais.
raised in translation says: aquela luz do dia em Lima. o brilho da noite na caje das pizzas. o sol se pondo em Cuzco, e nascendo também em Cuzco. as ruínas e o frio da manhã em Machu Picchu, o sorriso de Melissa em Amantàni, o Jeva e a Juju descendo a rua em Arequipa de mãos dadas.
juliano-me-myself says: wordless
raised in translation says: speechless juliano-me-myself says: as cores eram mais fortes dentro de você do que na paisagem que você via?
raised in translation says: as cores são sempre mais fortes dentro do que fora. cores…
juliano-me-myself says: cores de Almodovar…
raised in translation says: cores de Frida Kahlo, cores...
juliano-me-myself says: passeio pelo mundo...
raised in translation says: passeio pelo mundo.
juliano-me-myself says: menina-poema.

O que te peço, o que me pedes

O que te peço?
Não é muito nem pouco, é nada além do que deveria ser dado no momento em que as palavras se fazem “sim”.
O que te peço? Parte de teu colo, de tuas mãos e teus sorrisos, porque sei que outras partes pertencem a ti para serem distribuídos a seu bel prazer.
O que te peço? Apenas parte de teu abraço, mas quando for em mim que seja inteiro, que me envolva e me aperte e me faça perder o ar.
O que te peço? Palavras doces e cheirosas, suspiros vindo do coração, eterna saudade inimaginável de ser morta pois é maior que o mundo.
O que te peço? Vem cá, chega mais perto. Deita tua cabeça em mim e chora.

.

O que me pedes?
Muito, tudo e qualquer coisa. Promessas não feitas e frases não proferidas, mais do que sinto ter a dar.
O que me pedes?
Todo o meu corpo, minha alma e meu ser, em toda a sua totalidade. Que meus olhos sejam apenas teus e meus sorrisos para ti.
O que me pedes?
Que te preencha de coisas que você nem sabe o que são. Que te dê o que você não se dá, que te ame como nunca amou ninguém.
O que me pedes?
Meus sonhos, minhas falas enquanto durmo, que eu me vire exatamente na tua direção e que te puxe comigo, para acompanhar meu movimento.
O que me pedes? Me deixa. Hoje eu preciso sair só.

.

E assim caminha a humanidade...
Com passos de formiga e sem vontade.

Contorcionismo

No, thanx says: Eu tenho a mais absoluta certeza de que ele me traiu.
Raised in translation says: E se tiver te traído? Isso já faz um tempo né?
No, thanx says: Isso é absolutamente determinante prá forma como eu encaro o mundo hoje em dia.
Raised in translation says: Cuma?
No, thanx says: Eu não confiar no Guto. Isso tem tudo a ver com o fracasso que foi meu relacionamento com o Beto. É muito muito foda dizer isso, mas as vezes eu sinto que enquanto não tiver absoluta certeza do que aconteceu com ele, nunca vou deixar o Guto se aproximar de verdade.
Raised in translation says: Mmm
No thanx says: É sempre a mesma coisa. Toda vez que alguma coisa boa tá acontecendo, vem ele e me tira o gosto doce dessa coisa boa. To super cansada disso acontecer na minha vida.
Raised in translation says: Mmm
No, thanx says: Parece um carma.
Raised in translation says: Espera um pouco que eu preciso ver se to te entendendo.
No, thanx says: Uhum
Raised in translation says: Você tá me dizendo que o Guto, o todo perfeito Guto, que você dizia ser o homem da sua vida, está sendo tirado deliberadamente dela, justo quando ele resolve te assumir e te apresentar pros filhos...
No, thanx says: Isso
Raised in translation says: E que o responsável por este afastamento é o seu ex-namorado de 3 anos atrás, que hoje já tá até falando de casar com outra, e com o qual vc não fala há quase um ano?
No, thanx says: De repente me senti um pouco louca vendo vc colocar as coisas dessa forma Raised in translation says: Gata, vc pirou.
No, thanx says: Hein?
Raised in translation says: Vc tá morrendo de medo porque, apesar de ter brincado de casinha a vida toda, tá tendo a chance de brincar de casinha na vida real e morre de medo que aconteça com vc a mesma coisa que aconteceu com a sua mãe. Que o Guto te largue do mesmo jeito que tua mãe foi largada e que vc caia o cavalo como ela.

(muitos minutos de silêncio)

No, thanx says: Simples assim? Vc acha que o Guto e o Beto não tem nada a ver com isso? Raised in translation says: Yeap
No, thanx says: Minha psicóloga me disse a mesma coisa.
No, thanx says: Mas ouvindo isso de vc me faz muito mais sentido.
Raised in translation says: Despede ela e começa a me pagar.
No, thanx says: Pelo menos vc gastaria com whisky de boa qualidade
Raised in translation says: Ô!
No, thanx says: Hahahaha
Raised in translation says: E ainda te daria presentes melhores no seu aniversário!
No, thanx says: Done!

Piadas à parte: eu ficaria rica.

Sacrifício

Ela fuma um cigarro olhando a água, que reflete a luz de uma lua quase cheia. Vê quando a sombra distante vai diminuindo no chão, até que ele aparece no pé da escada.

Ele: Tá aí?
Ela: Sempre.

Ele se aproxima. Se senta no banco branco, e dá um tapinha no assento, como tantas outras vezes havia feito, chamando-a. Ela obedece prontamente.

Ele: Que há?
Ela: Não sei.
Ele: Sabe sim. Não sabe?
Ela: Sei sim.
Ele: Que há?

Silêncio.

Ela: São todas essas coisas, todas essas dúvidas, todo esse vazio.
Ele: Me deixa preencher seu vazio.
Ela: É um vazio impreenchível, que nem eu consigo preencher...
Ele: Toda vez que eu vou embora penso como seria se você morasse na rua de baixo.
Ela: Eu não moro na rua de baixo, não moro nem na cidade de baixo.

Silêncio.

Ela: Sinto que esse é um momento em que tenho que olhar prá mim... Difícil olhar prá outra pessoa agora. Às vezes sinto que estou dando tão pouco de mim, perto do que poderia ser.
Ele: O que você me dá tem sido suficiente.
Ela: Não para mim.
Ele: Entendi.

Silêncio.

Ele: Só espero que da próxima vez que você colocar outro dentro da sua casa, ele enxergue você e a sua família com o mesmo respeito que eu enxerguei.
Ela: Não tem outra pessoa, não tem ninguém. Se tivesse seria mais fácil... Seria mais fácil te tirar da minha vida pensando que outro vai entrar, mas não tem ninguém, não tem outro.
Ele: Esse orgulho você pode ter: dei o melhor de mim, ia pras festas e não via graça. Vinham outras mulheres e não tinham graça.

Silêncio.

Ele: Esse orgulho você leva prá sua vida, você foi a segunda que eu coloquei dentro da casa da minha mãe, que conheceu a minha vida.
Ela: É um orgulho, de verdade...
Ele: Gostei de você.
Ela: Eu gosto de você.
Ele: Não da mesma forma. Mas a vida é assim. Fui além, vislumbrei além, desejei além. Você não. Acontece.

Silêncio.

Ela: Tá bravo?
Ele: Chateado.
Ela: Decepcionado?
Ele: Frustrado.
Ela: Me desculpa.
Ele: Não tem de quê.

Silêncio.

Ela: Nesse momento prefiro ser sua amiga... Por mais que eu tenha certeza de que posso me arrepender.
Ele: Se você se arrepender a gente conversa de novo.
Ela: Você vai querer me ouvir?
Ele: Sempre.

Silêncio.

Ele: Foi bom enquanto durou. Me diverti muito. Aprendi muito.
Ela: Não é uma despedida.
Ele: A despedida já foi e eu não sabia que tava me despedindo.
Ela: Nem eu.

Andam até a porta da pequena casinha onde ela está dormindo.

Ela: Você vai prá cidade?
Ele: Vou tomar umas cervejas por aí.
Ela: Onde você vai?
Ele: Vou ver se me acho numa dessas curvas.
Ela: Você vai se cuidar?
Ele: Sempre.

Silêncio.

Dia seguinte, reunião com vista para o lago. O céu azul faz contraste com o verde das árvores. Calor. Sol quente. Lembranças de um final que podia ser um começo. Ela procura seus olhos mas eles estão vermelhos. Muitas cervejas para tomar e poucas curvas para se encontrar.

No abraço de despedida ela sente o coração bater forte.

Ele: Se cuida.
Ela: Sempre.
Ele: Boa sorte.

Foi bom enquanto durou.